Quando 1 + 1 não é = 2

Aqui há tempos disse-te que ainda havia de falar sobre o que estava a sentir naquele dia em que uma amiga tinha assinado o seu divórcio. A Bi é a única amiga que tenho que se divorciou. Conheço várias outras pessoas que se separaram. Mas assim da minha idade, que tenha casado, não apenas ido viver junto, é a única.

(O meu “apenas” não é para menosprezar, não estou a dizer que sofre mais quem se casou e se divorcia do que quem se separa sem nunca se ter casado, atenção. Mas acho que quem fez questão do anel no dedo e do joelho no chão porque valoriza a tradição e esses rituais associados a uma união de duas pessoas, quem, depois, se prestou à trabalheira que é organizar um casamento e aos gastos que o bom gosto implica e que, ainda por cima, pode passar a ter um IRS menos favorável, é porque não podia não acreditar com toda a convicção naquela relação. Dá-me sempre ideia de que é mais fatal um divórcio do que uma separação, da mesma maneira que um casamento é uma coisa mais definitiva, mais assumido, mais querido, do que uma união de facto, que me dá ideia de preguiça, não sei explicar…)

Como é que se passa de uma certeza tão grande para um fim simples e rápido? Acordado, tranquilo, certo de que é o fim que se pretende? No vértice oposto ao da opulência de uma boda e das borboletas na barriga do primeiro tempo?

Faz-me impressão. Não julgo, não é que condene ou que ache que uma vez casados (ou juntos, aqui é igual) têm que se manter assim para o resto da vida só pelo compromisso, credo!, o que seria?! Mas é esquisito, faz-me impressão… É como quando temos qualquer coisa no olho que nos incomoda, apesar de não nos impedir de ver.

Estes dias em que eles estiveram doentes e em que fiquei em casa feita enfermeira, só pensava, qual Calimero: “a estucha que é ter tudo nos ombros sozinha, trocar cocós, esperar que ao menos não vomite!, medir febre de duas em duas horas, noite e dia, preparar sopa de cenoura com arroz, separar o caldo, cozer maçã, entretanto ir acudir um sonho mau que interrompeu a sesta, voltar à cozinha e ainda não é para te alimentares a ti, embalar, dar colinho, dar atenção, separar os dois quando se pegam, suportar o quinquagésimo nono ‘maííím‘ da ultima hora com o mesmo sorriso afável como se fosse o primeiro, brincar mais, dar um ralhete, dar outro, insistir para que coma, limpar lágrimas, etc…” Mas acabava por parar de lamber as feridas e  pensar que é só por três a cinco dias, que a febre ia passar e que no fim o pai ia lá estar e tudo seria mais fácil outra vez porque, connosco, é a quatro mãos.

Mas e as que não têm o pai nem à noite? E quando ele não volta nem no fim de semana? E aquelas para quem é mesmo sempre, SEMPRE, tudo sozinhas, haja febre ou estejam eles saudáveis, sempre a contar só consigo próprias?

Não tenho pena da Bi. Não há por que ter. Ela, como todos os outros que se divorciam ou separam, fez essa escolha, seguramente porque concluem que a felicidade passa antes por outro lado que não aquelas relações. Mas não deixo de sentir as dores de quem leva uma família só a duas mãos. Pior está quem, mantendo as suas relações, tem os maridos ou companheiros a viver longe porque a vida a isso obriga. Pior ainda, as viúvas, para quem a separação não foi uma escolha sua.

E, agora, mal acabo de escrever isto, penso que também estou a ser injusta por me solidarizar primeiro com as mulheres, porque com certeza que os viúvos, os divorciados e os separados – não sejam eles uns trastes – sentem exatamente o mesmo fardo acrescido por serem sozinhos. Perdoem os homens, não queria ser sectária. Conheço o caso de um pai cuja vida familiar era maioritariamente assegurada pela mulher e que, perante o súbito estado vegetativo em que ela entrou (um AVC, creio), ele teve que reformular todas as suas prioridades, abandonar uma comissão de serviço de chefia, passar a sair às cinco todos os dias para apanhar as três crianças na escola, acompanhar trabalhos e brincadeiras, higiene e alimentação, enfim, os cuidados básicos dos filhos menores. Também tenho um amigo que se separou (escolheu, portanto) e é um pai extremosíssimo que partilha a guarda da filha de dois em dois dias, três quando se mete o fim de semana (sim, isto existe).

Portanto, o intuito deste post é ser tão-só uma reflexão sobre o difícil que é ser responsável por uma família e como fica tão mais fácil quando se tem com quem o partilhar com um copo de vinho ao fim do dia. A minha palmadinha no ombro a quem, por escolha ou sem ela, não tem.

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