Pensar pela própria cabeça

Quando lhes perguntas “então como foi o dia?, o que fizeste na escola?”, podes ter a certeza que a resposta vai ser qualquer coisa vazia como “foi boa” ou “não me lembro”! Acertei? Então, mais vale fazer ao contrário, começar por contar como foi o teu dia e esperar reações; aparecem de certeza! É assim que sei que os meus filhos gostam de sopa de beterraba, por exemplo. Não sou eu que a faço em casa, só a comem na escola e soube que gostam porque um dia me pus “a mãe hoje comeu a sopa toda, portou-se muito bem!” e, imediatamente, saltaram as vozes pequeninas e esganiçadas “eu também!! E era sopa cor de rosa!”. Catchiim… 😉

Hoje vinha no carro com o Manel num exercício do género para lhe provocar conversa. O do “preferes isto ou aquilo”. Então fiquei a saber que:

– prefere peixe a sopa;

– prefere encarnado a azul;

– prefere matemática a qualquer outra matéria, que prefere inglês a estudo do meio e que estava convencido que estudo do meio e português eram a mesma coisa (🙄);

– entre andar de barco ou de avião,  mais depressa vai pelos ares (salvo seja!);

– vacila entre a neve e a praia (mas eu acho que é só porque hoje é inverno e deve parecer-lhe adequado dizer neve)

– e que tem um sorriso lindo, ainda com dentes de leite, quando se sente apanhado num dilema.

Depois foi a vez dele. “Preferes a oliveira ou a laranjeira?” E eu… sei lá eu de árvores, valha-me Deus!, mas lá fui raciocinando alto: “sabes que a mãe e o pai já quiseram plantar uma oliveira no jardim? A oliveira é linda… mas a laranjeira também é! E dá uma flor linda e bem cheirosa. Além das laranjas, que podemos comer logo, ao contrário do azeite que vem da oliveira mas só depois de apanhadas e tratadas as azeitonas… então, sim, acho que prefiro a laranjeira!” (Uff… vai, next!)

– “Preferes estes prédios ou um arranha-céus?” 😳 póiiim…

– “Oh Manel, tu és muita bom a jogar o ‘preferes’, pá, se eu soubesse que tu me ias encalacrar a cada pergunta…”

– “Oh mãe, vá láááá…”

– “Estes prédios!”

Ele tem pouca pachorra para ouvir a minha construção do raciocínio, ele quer o imediato, a resposta final, interessa-lhe pouco como é que eu elaboro e chego à minha escolha. Ele tem 6 anos. Quer lá saber se eu prefiro estes prédios que têm menos vizinhos e menos chatices que um arranha-céus! Mas o meu papel é ajudá-lo a raciocinar. Por isso me detive na flor de laranjeira e no cheirinho dela mais do que ele gostaria. E também é meu objetivo, com isto, transmitir-lhe conhecimento, desde o geral até ao mais familiar. Ele ficou a saber que o carro que o pai conduz já conduzi eu durante uns anos, por exemplo (porque me perguntou se gostava mais do meu carro ou se do do pai), e que estava planeada há anos uma oliveira mas que a mãe se deixou disso porque procrastinou e agarrou-se a uma coisa que a tia N. disse sobre as oliveiras deixarem tudo sujo à sua volta! 😄

Ao jantar, virou-se para o avô: “avô, preferes a oliveira ou a laranjeira?” E o avô respondeu-lhe com o azeite e com a oliveira. Ele olhou logo para mim de dedo em riste: “a mãe prefere a laranjeira!”, como quem diz “tu deste uma resposta errada”. “Manel, este é o jogo das opiniões. Das coisas de que cada um gosta mais. Não há respostas erradas, cada um gosta do que gosta e os outros devem respeitar isso. Se tiveres dúvidas sobre o que é que tu gostas mais, podes sempre ouvir os argumentos de um lado e de outro e no fim ver qual é que faz mais sentido para ti. E isso é uma boa ajuda, mas tu deves sempre pensar pela tua cabeça!”

Por acaso não me ocorreu, mas da próxima vez que lhe quiser ginasticar os neurónios hei de perguntar-lhe “(e tu,) preferes a laranjeira ou a oliveira?”

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