Esta coisa de ir ter um filho, correndo tudo bem, clinicamente falando, tem que ser o mais emocional, humano, familiar e próximo do que mais faz sentido para a família possível. Não faz sentido de outra maneira.
Há quem queira parir em casa ou dentro de água e se vá informar para que assim seja. Há quem faça questão de levar a sua própria banda sonora em vez de levar com a música que alguém escolhe por si. Há quem peça a bola de Pilates e quem nem sequer saiba que está provado que parir um filho deitada é a pior posição possível para mãe e bebe e só tem benefício para os clínicos. Há quem fique a ver os filhos serem levados sem fazer o pele a pele só por vergonha de falar ou para não incomodar as equipas. Há quem faça questão de cortar o cordão umbilical e quem dê importância a outras coisas. Há quem tenha todas as certezas do mundo sobre o que quer e não quer e há quem mude de ideias (e pode!)… É para isso que servem, por exemplo, os planos de parto. Aquele formulário, ou lista, ou post-it, ou tão só a conversa que tens, informada e fundamentada, com quem vai cuidar de ti e do teu bebé no dia em que ele nascer. Enfim, toda uma série de coisas pequenas e outras maiores que, podendo ser atendidas, não há porque não ser e sobre as quais simplesmente nos acanhamos de falar nelas ou, com o nervosismo do momento, nos esquecemos.
Lembro-me, por exemplo, de andar com o DVD sempre a postos e, nos dias das ecografias do Manel, com os nervos e consumida por tudo aquilo que era realmente importante, acabar invariavelmente por me esquecer do estender ao medico! Da Júlia já nem comprei DVD!! Também me lembro de ter dado a primeira roupa dele à enfermeira que o recebeu sem mais instruções e de, de repente, o ter visto vestido com o body a abotoar por cima das calças!!
Hoje em dia, olhando para trás, houve algumas coisas que teria verbalizado melhor, que teria pedido assertivamente ao invés de simplesmente me entregar nas mãos de quem sabia o que fazia e ter partido do princípio de que, ali, só eles é que sabem. Hoje em dia sinto que isto não é verdade. Salvaguardada a sanidade de mãe e filho, só quem sabe o que tu queres és tu. Não são os médicos que adivinham. E se não lho disseres, vais deixar de ter o que preferias só porque te faltou capacidade de comunicar. A falar é que as pessoas se entendem e com educação tudo se pode perguntar. Não faz mal dizer que queres isto e aquilo e, se clinicamente puder ser, de certeza que te atenderão a preferência. Fala!
Quando a Júlia nasceu já pude perguntar mais coisas, outras coisas. Fui eu quem alertou para o meu tipo de sangue negativo, por exemplo, e assim se evitou um grande imbróglio por mero lapso. Também fui eu que percebi que a janela dos primeiros seis dias para fazer o teste do pezinho havia de calhar entre a minha alta e o fim de semana comprido, em que o centro de saúde estaria fechado, e alertei os médicos e enfermeiros para a necessidade de o fazerem logo lá no hospital. Coisas que não são prioridade para eles é que por isso é natural que sejam esquecidas. Se não comunicares sem medo de estar a interferir ou a ensinar a missa ao padre, pode bem acontecer transformarem-se num verdadeiro problema para resolveres mais tarde.
Quer dizer, a verdade é que há sempre aquela humildade de te reduzires à tua insignificância (como se não fosses tu e o teu bebé o mais importante de tudo ali) e ficares só muito atenta a todos os procedimentos que eles já fazem maquinalmente, só porque é assim há anos. Humilde e sempre educadamente, há espaço para tudo, até para discordar dos procedimentos de sempre e para fazeres valer aquilo que para ti faz mais sentido.
À terceira vez já sei bem o que quero e o que não quero, o que posso e o que os médicos preferem (que, nalgumas coisas, se situam em polos opostos). Desta vez, em que sinto que é talvez a última, sinto que me devo essa sensação de que não ficou nem uma palavra por comunicar, nem um desejo por manifestar, nem uma preferência por fazer valer. Não posso viver o resto da vida a pensar “se eu ao menos tivesse dito…”, não posso. Tenho a obrigação de me proporcionar essa tranquilidade de espírito de saber que, ao menos, falei, pedi, manifestei o que para mim era importante.
Uma pessoa informada tem mais poder. Eu sinto que estou informada. Passei por isto duas vezes antes, fiz três vezes o curso de preparação para o parto, acompanho as notícias e as últimas evoluções no que diz respeito à humanização dos partos. Não voltarei para casa com respostas incompletas nem com dúvidas. Nao me contentarei com nenhum “Ah, mas aqui fazemos assim e asado”/”é assim porque sim”/”Sempre se fez assim”. Se a Natureza e o Frederico deixarem e salvaguardando o mais possível o risco clínico, sendo apenas uma questão do que eu ou terceiros preferimos, farei questão de que as coisas se passem como EU quero e não como poderia dar mais jeito aos outros.