Quinta-feira é dia de feira. Aos anos que não ia à feira!… Lembro-me de ir com a minha avó I., de mão dada pelas ruas da freguesia, eu ora aos saltinhos, a fazer rodopiar a saia de folhos, ora armada em mais crescida, “avó, agora faz de conta que eu tinha 9 anos [não sei porquê 9!] e eu já sabia ir sozinha na rua e tu falavas comigo, vá!” e avançava dois ou três passos e ela alinhava “olá, minha menina, então onde vai sozinha?“, eu orgulhosa “vou ali abaixo à feira” e ela continuava “e não se perde? a sua mãezinha sabe que a menina lá vai?” e eu, toda empertigada, de queixo empinado “sim, sim, eu vou fazer um recado à minha mãe!” :)
A avó I. fazia-me conversas pedagógicas que ainda hoje oiço cá dentro, emolduradas justamente por aquele cenário do caminho até à feira e, depois, já lá, por entre bancas de roupa aos montes e gritos ensurdecedores de ciganas a vender. Era a caminho da feira que me ensinava a atravessar a estrada (hoje em dia os miúdos andam de carro para todo o lado, as nossas oportunidades são tão menos…), que me ensinava que não se aceita nada de estranhos, nem um doce, porque pode haver gente má que, com um doce e a promessa de outro ali no carro, nos queira levar (e nos anos 80 não se falava de raptos e de pedofilia como hoje em dia…), que me convencia a comer tudo o que me pusessem no prato (eu era péssima para comer), que me consciencializava para a economia doméstica (“vamos só buscar fruta e legumes, não há moedas para brinquedos, está bem?” eu anuía e ela dizia-me sempre “és tão compreensiva, filha!“, aprendi esta palavra, ‘compreensiva’, com a avó I. a caminho da feira, não tenho dúvida nenhuma que foi aí!), que me falava da importância do respeito pelos outros, pelos mais velhos em particular (e assim foi que tive sempre a minha Professora Josefina como uma grande autoridade, por exemplo), que me ensinava os caminhos (“filha, imagina que agora lhe dava uma coisa à avó e eu esquecia-me de tudo, de quem era, de onde estava, do que viemos aqui fazer… tu sabias voltar para casa? Mostra-me lá, por onde é que íamos? Leva-me tu!“)… fantástico! Agora, que escrevo sobre isto, apercebo-me do que se quer dizer quando se fala da riqueza que é ter avós…
Mas, bom, tudo isto para te contar que, neste tempo em que estou em casa, tenho ido à feira outra vez, pela primeira vez desde que a minha idade ainda nem sequer tinha dois dígitos. Na primeira semana fui à cata de pechinchas (capas de edredon Zara Home a 15€??!!), na segunda voltei porque tinha vindo absolutamente incrédula com as pechinchas que de facto por lá se encontram, na outra fui para devolver umas sandálias de borracha para a praia que afinal não serviram e hoje não fui à feira, fui à praça. Já das outras vezes tinha vindo estafada, de língua de fora só com uma voltinha (porque até tenho tido a sorte de estacionar pertinho) e com pena que a ciática me impedisse o caminho até às frutas e legumes. Hoje fui só para isso.
Os meus pais também têm muito a rotina de ir ao mercado e compram lá de tudo, desde os queijos (maravilhosos) ao peixe fresquíssimo. Eu, com vida de escritório, limitava-me a pedir-lhes que me trouxessem uma coisa ou outra e só podia ouvir-lhes as histórias da ida semanal ao mercado, a vendedora X que se mudou para o outro lado do espaço, a da outra que passou a ser muito careira e “nunca mais lá vou!”, as dos queijos que vêm de Évora mesmo e que estão ali às não sei quantas da manhã para amanhar tudo, a daquela que se pegou com aqueloutra, a das velhotas que se atropelam para serem atendidas primeiro… Divertido. Mas hoje que lá fui eu própria, disposta a demorar-me pelas ruelas entre as bancas dos vendedores, pude experimentar tudo isso e venho deliciada!
Não podia trazer muita coisa, por causa do peso, claro. Mas ia à procura, pelo menos, de fruta cheirosa. Daquela que está tocada pelos passarinhos ou pelas minhocas. Da feia. Que sabe mesmo ao que é. Das cebolas que ainda trazem terra agarrada à casca e que não vêm de Espanha nem de França, como as que povoam invariavelmente as bancadas dos supermercados. Queria lá saber se era mais caro ou não (que não foi, de todo.). Fui procurar sabor.
E foi realmente tão fácil encontrá-lo… Antes do sabor, os cheiros. Os cheiros que aqui estão em casa, meu Deus, obrigada por esta mescla de cheiro a morangos com cheiro a cerejas – eu já nem me lembrava que as cerejas cheiravam! E os figos (a 4 e 5 euros o quilo, rai’s parta), os figos que parecem mel, humm… *inspirando de olhos fechados*
Acho que vou fazer disto uma rotina de quinta-feira.
Também gosto muito e tenho a sorte de o mercado vir ao trabalho, assim conseguimos optimos legumes e frutas! Ah!!! E, por falar nisso, esta semana vieram mirtilos!!! :D
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Daqui a 11 meses fazes a mesma graça da outra vez ao Ico. 😄
(Olha! Se tivesse sido com a Jú tinha corrido mal, já viste?)
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