Os meus filhos não têm a mesma educação

São indivíduos diferentes. Por que carga de água teriam a mesma educação?

Costumo ouvir dizer com admiração “filhos da mesma mãe e do mesmo pai, a mesma educação dada a um e a outro, e eles não podiam ser mais diferentes”. Acho que há aqui muita confusão de conceitos. Se a coisa se postulasse antes assim


“filhos da mesma mãe e do mesmo pai, as mesmas oportunidades educação dadas a um e a outro, e eles tomaram opções diferentes porque não podiam ser mais diferentes”


aí, já teria mais sentido para mim. Eu não sou a mesma mãe para a Júlia que fui/sou para o Manel.

O Manel, sendo o primeiro, é o das experiências (das tentativas/erros/alternativas), com tudo o que de bom e mau há nisso. É o do tempo todo em absoluta dedicação a si – como se costuma dizer, quando se tem o primeiro filho temos tempo para ficar ali a olhar para ele à espera que chore – o que beneficiou de toda a nossa capacidade de tolerância e paciência (porque tínhamos tempo para isso). A Júlia, a segunda, já podia chorar  de noite que já nenhum de nós se levantava num pulo ao primeiro acorde. Não é que a amássemos menos ou que não tivéssemos a mesma disponibilidade de afetos para com ela. É só que já estávamos mais tolerantes ao choro de recém nascido e porque, lá está, como já tínhamos a experiência anterior, sabíamos que às vezes eles resolvem sozinhos.

Outra: tenho imensas fotos dele a rebolar na minha cama naqueles meses da licença. Ora a dormir, ora já de barriga para baixo naquela habilidade de segurar a cabeça (aka: tartaruga :)), ora já a por-se de pé apoiando-se na cabeceira da cama… Dela: zero. Zero fotos na minha cama ou próximo disso. Mais uma vez, não é que a amasse menos ou que tenha resolvido entre um e outro que a cama dos pais é exclusiva dos pais ou ainda que tenha decidido dormir no chão. É só que, enquanto estive de licença de maternidade do Manel, o pai saía para trabalhar e a mãe e a cria ficavam no mimo sem horas (e assim se ouve tanta recém mamã dizer que almoça às 14h, quando almoça); quando estive de licença da Júlia, o pai saía para trabalhar e a mãe arranjava-se e às crias para sair porque havia o Manel para ir levar à escola! Ah pois é! E depois de banho tomado e vestida e de já ter levado com o ar fresco do dia na fuça quem é que volta para os lençois desfeitos? Não volta. Fica no chão da sala a brincar com a cria. Ou seja: a dedicação emocional está lá, o cenário é que é outro e o ritmo também é logo pautado por fatores externos (relógios! compromissos!) e não apenas pelo sabor do que nos apetece.

(e repara como a princesa está sempre arranjada – porque saía cedo de casa para levar o mano à escola – e como o desgraçado se apresenta sempre em trajes menores :D)

Mais (e esta aflige-me um bocado sempre que penso nela): às primeiras birras e asneirolas do Manel, todos achámos muita graça e tivémos todo o tempo para ir gradualmente educando e ensinando que não se bate, não se atira, não se isto e aquilo. A Júlia, que está a abeirar-se dos terrible two neste momento, tem a vida muito mais facilitada por um lado, porque imita o irmão e, também por imitação, já vai sabendo “sozinha” o que se faz e o que não se faz, mas, por outro, há muito menos complacência com ela porque não há tempo para estar ali a saborear a “gracinha que é o menino dizer ‘nhão’ e cruzar os bracinhos num amuo”. É mais  “aaah, a bater?! era o que faltava! faz favor de fazer já uma festinha!” e acabou-se a margem para a “gracinha”. Além disso, o Manel não tinha ninguém a quem eu dirigia ralhetes, raivas, caras feias e voz alterada. A Júlia tem: o irmão. A mãe do bebé Manel era uma mãe muito mais sorridente e bem disposta do que a mãe da bebé Júlia, que também é mãe do pequeno toddler todo argumentativo Manel, e vê-me muito mais vezes de mau humor ou zangada do que o irmão alguma vez viu.

Nestes pequenos detalhes do dia a dia dou por mim a pensar que, realmente, não é por se ser filho dos mesmos pais que a educação é necessariamente a mesma. Se as circunstâncias são outras, as nossas reações serão necessariamente diferentes e o que é dado a um pode bem não ser o mesmo que foi dado ao outro. E, acima de tudo, cada filho é um indivíduo diferente, com a sua personalidade mais permeável ou menos a este tipo de coisa ou àquele.

Não é por mal que se surpreendem as pessoas com os diferentes sucessos de filhos criados na mesma família. Mas também não me levem a mal que diga que na diferença é que está o nosso valor. E que os meus filhos todos, o que está por nascer inclusive (esse já vai ser o que come feijoada ao pqueno almoço, está bom de ver :D), saibam fazer o melhor com as ferramentas que eu e o (mesmo ;)) pai lhes damos.

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