Violências 

Hoje partiu a televisão com o cabo de uma pá, já ela partida de traulitadas anteriores.


Fazia o quê? Espancava-o? Ficava de castigo até ao Natal? E como? Sem ver bonecos? Sem jantar?

Tem dois anos e meio, quase três. Não percebe nada disso nem o alcance do que fez. Para ele é como o copo que se partiu ontem ou como quando desfaz um puzzle e ficam peças por todo o lado. Percebe a minha cara, voz, comportamento pouco empático, isso sim. E foi o que fiz, até porque era o mais honesto e verdadeiro: se estava zangada e triste, porque não mostrar-lho, chorando, se preciso fosse?

Tenho PAVOR que esta facilidade de puxar a mão atrás seja prenúncio de um pequeno bully. Pavor. Não há quem se empenhe mais que eu em educar os filhos no amor, no carinho, no respeito mútuo, mesmo que isso às vezes provoque comentários críticos das minhas amigas e mesmo dos familiares, confundindo isto com permissividade. Sou a mais empenhada em que eles sejam felizes e com uma autoestima intocável. Mas…e se eu não souber dizer onde está a fronteira entre esta fase de atirar com coisas e bater, por que todos passam, e violência intrínseca?! E se daqui a uns anos ele for um dos bullies da Figueira da Foz? Ou o polícia de Guimarães?

Repara: este tal polícia. É polícia. Está no lado dos bons. E de repente vá de sacar do bastão e de pregar ali valentes vergastadas nas costas de um homem que só gritava pelo filho e o filho por ele, já todo mijado, pobre criança!, a ver “os bons” a baterem-lhe no pai, que seria o mais próximo que aquele miúdo tinha de uma referência de valentia e liderança. Aos olhos daquele menino, o pai, o seu garante de segurança, não foi tão forte assim quando encontrou um ladrão…ai, não, espera, um polícia!!, quando encontrou um polícia com ganas de aviar alguém naquela tarde.

Eu quero cá saber do Benfica e do futebol e da violência das claques e de generalizações. A mim só me ocorre que um miúdo de uns 12 anos se mijou de aflição por ver o pai naqueles apuros. O pai é proteção, é intocável, é chefe de família, é o superherói daquela casa e de certeza que tem uma capa escondida na gaveta do armário e tudo. E de repente, aquele cabrão, arruina esta imagem que um menino tem do seu pai. Isso, pra mim, é ainda mais grave que as bastonadas. Grande pulha acometido de raiva que não se sabe controlar…

E era isto que outro dia te quis dizer sobre o caso de Guimarães: o que me choca ainda mais é aquela aflição extrema que leva ao descontrolo do esfíncter de uma criança que ali perde parte da inocência. A inocência devia ser intocável.

E hoje, quando o meu filho dá com o cabo da pá na televisão e a deixa neste estado, só me ocorre isto! Haverá tal coisa como violência intrínseca e gente que nunca sai da fase do atirar com os brinquedos e do bater?! Será o homem intrinsecamente mau e a sociedade é que o modera?

Enfim, não vou voltar à História das Ideias Políticas, que tanto trabalho me deu há anos atrás, mas a sério que me desilude que o Manel não consiga transferir a raiva ou seja lá o que for que sente naqueles momentos por abraços, por exemplo! Sei que uma das estratégias para lidar com isto é exaltar aquilo que ele faz de bom. Ou seja, em vez de lhe dizer “lá estás tu outra vez a bater com isso aí!”, dizer-lhe “olha, em vez de quereres bater no teu irmão, agarra-te a ele e dá-lhe um abraço muito bom, daqueles muito bons que só tu é que sabes dar! Tu dás abracinhos tão bons, Manel…” E faço-o tantas vezes.

Hoje não cheguei a tempo e quando olhei pra trás, para perceber o que tinha sido aquela pancada seca, pronto, já só via as pontas da fibra ótica de fora!!!! 😏

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4 thoughts on “Violências 

  1. Pois, isto é coisa para deixar os nervos em franja é… E as tuas dúvidas em relação à agressividade física fazem-me lembrar as minhas em relação à agressividade nas respostas. É uma fase ou o míudo é mesmo insolente/mal criado/arrogantezinho? Enfim… o tempo o dirá. Até lá faço o melhor que posso.

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    1. Que é uma fase, é. Não será à toa que lhe chamam os terrible two. E que se pode prolongar até aos 4, também sabemos.
      O busílis, para mim – e é mais isto que eu quero deixar como mensagem nestes posts – é a maneira como nós, adultos, gerimos o stress que isto nos causa. Neles é uma fase, em nós é que provoca uma pescadinha-de-rabo-na-boca de emoções más.
      ninguém disse que ia ser fácil, não é verdade? ;)
      E nós insistimos, portanto é porque, para lá das birras, há de haver muita coisa boa que compensa e até ultrapassa tudo isto ;*

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